quarta-feira, abril 23, 2025

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Morre Margaret Thatcher — e os trabalhadores fazem a festa


Há 12 anos, em 8 de abril de 2013, falecia Margaret Thatcher. Filiada ao Partido Conservador britânico, Thatcher foi primeira-ministra do Reino Unido entre 1979 e 1990, período em que ajudou a consolidar a hegemonia da agenda neoliberal.

Durante seu governo, Thatcher promoveu a privatização de estatais, atacou os sindicatos, cortou investimentos públicos e extinguiu programas sociais. Suas reformas tiveram um impacto extremamente negativo sobre a classe trabalhadora, ampliando o desemprego, precarizando os serviços públicos e jogando milhões de famílias na pobreza.

Não por acaso, o anúncio da morte da líder conservadora foi recebido pela população com um enorme festejo. Nas grandes cidades do Reino Unido, as ruas foram tomadas por multidões, que se reuniram para beber, dançar e celebrar o desparecimento de uma figura que os submeteu a anos de sofrimento — realizando um protesto simbólico contra o pernicioso legado neoliberal deixado pela “Dama de Ferro”.





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Os anos iniciais

Nascida em Grantham, em 1925, Margaret Thatcher iniciou sua militância política durante a graduação. Quando ainda era estudante de química do Somerville College, ela assumiu a presidência da Associação Conservadora da Universidade de Oxford.

Thatcher foi fortemente influenciada pelo pensamento da Escola Austríaca — sobretudo pelo trabalho de Friedrich Hayek. Já na época da universidade, ela se tornou uma fervorosa defensora do Estado mínimo e do livre mercado, atacando a ideia de “Estado de bem estar social”.

Mas, embora fosse famosa por seus discursos e frases de efeito demonizando o Estado e os beneficiários de programas sociais do governo, Thatcher faria carreira como agente política, passando 54 anos de sua vida sendo sustentada pelo Estado.

Ela ingressou na política institucional em 1950, após se filiar ao Partido Conservador. Em 1959, foi eleita representante da Câmara dos Comuns, onde frequentemente se posicionou à direita de seu partido. Em 1961, por exemplo, Thatcher contrariou a posição de sua agremiação e votou a favor do retorno do espancamento como castigo corporal judicial — um hábito que fora banido pela Lei de Justiça Criminal, sancionada em 1948.

Em 1967, Thatcher foi selecionada pelo governo dos Estados Unidos para participar de um programa de formação de lideranças. Apresentada pela embaixada norte-americana como a “provável futura primeira-ministra do Reino Unido”, ela teria sua carreira política alavancada através de contatos com personalidades poderosas como Nelson Rockefeller, Paul Samuelson e Walt Rostow.

Secretária de Educação de líder da oposição

Nomeada Secretária de Educação durante o governo de Edward Heath, Thatcher conduziu uma série de ações extremamente impopulares. Alegando a necessidade de reduzir gastos, ela ordenou o corte do fornecimento de leite para estudantes da rede pública, provocando protestos das famílias carentes. A decisão lhe rendeu o apelido de “Milk Snatcher” (“Ladra de Leite”).

Thatcher cortou a subvenção das merendas e apoiou a proposta de Jacob Rothschild de subordinar o financiamento público de pesquisas aos interesses do mercado. Ela também decidiu suspendeu o subsídio governamental às escolas de gramática, forçando-as a encerrarem suas atividades ou a cobrarem mensalidades.

Após a derrota dos conservadores na eleição de 1974, Thatcher assumiu a liderança da oposição. Encarnando o papel de lobista do Instituto de Assuntos Econômicos, — um think tank ultraliberal fundado pelo magnata Antony Fisher — a líder conservadora articulou uma oposição ferrenha aos programas de proteção social e ao keynesianismo, defendendo teses como o “enxugamento do Estado”, “mais liberdade para as empresas”, desregulamentação financeira e redução dos impostos.

Buscando apoio dos conservadores, Thatcher atacou veementemente os imigrantes oriundos de países periféricos, usando de uma retórica racista. Ela argumentava que o Reino Unido estava sendo “inundado” por imigrantes da Índia, do Paquistão e do Caribe — endossando, na prática, o discurso abertamente supremacista da Frente Nacional Britânica. Thatcher também foi uma apoiadora do regime do apartheid, opondo-se ao movimento internacional que pressionava pela imposição de sanções ao governo segregacionista da África do Sul.

Primeira-ministra

Thatcher foi eleita primeira-ministra em 1979, após articular a moção de censura que resultou na queda do trabalhista James Callaghan. Sua gestão econômica implementou uma série de medidas do receituário ultraliberal, em especial os ajustes fiscais pautados pelas recomendações de Milton Friedman e Alan Walters.

Sob o lema “There Is No Alternative” (“Não Existive Alternativa”), ela defendeu que o neoliberalismo era o único sistema possível — e que, por isso, não havia razão para que os cidadãos opinassem na condução econômica do país. O receituário neoliberal deveria ser imposto, quer os eleitores o aprovassem ou não.

Seguindo uma rígida política de austeridade fiscal, Thatcher cortou investimentos públicos e aboliu benefícios, pensões e programas sociais. Os serviços públicos foram gravemente afetados, com consequências drásticas para as famílias mais pobres.

A política tributária de Thatcher foi particularmente prejudicial para os trabalhadores. A primeira-ministra reduziu as alíquotas do imposto de renda dos ricos, aumentando em contrapartida os impostos indiretos e sobre o consumo. Ela também instituiu o “poll tax” (“imposto comunitário”) — uma taxa de valor único que era cobrado de todos os habitantes, independentemente da sua faixa de renda.

Thatcher liderou um amplo programa de privatizações, incidindo sobre setores estratégicos como gás, água, telecomunicações e energia. Estatais como a British Telecom e a British Gas foram vendidas a preços subfaturados.

Programas públicos como as “council houses” (moradias sociais) também foram repassados ao setor privado. Thatcher também tentou, sem sucesso, privatizar o sistema público de saúde — mas conseguiu limitar e sucatear o serviço através do subfinanciamento.

As privatizações foram combinadas com a desregulamentação do setor financeiro, abertura econômica e abolição dos mecanismos de controle cambial, impulsionando a financeirização da economia. Ao mesmo tempo, o governo Thatcher promoveu o afrouxamento da legislação trabalhista e articulou medidas para suprimir o poder político e a influência dos sindicatos.

“Nossos pensamentos estão com as vítimas do thatcherismo”, diz a faixa exibida por manifestantes durante o funeral de Margaret Thatcher
Joshua Hayes / Wikimedia Commons

Política externa

A política externa de Thatcher foi marcada pelo incremento do militarismo, pela adesão à retórica anticomunista da Guerra Fria e pelo alinhamento automático aos ditames de Washington, então sob o governo de Ronald Reagan.

Thatcher defendeu a expansão da OTAN na Europa e autorizou a implantação de cruzeiros nucleares norte-americanos no território britânico.

As forças nucleares do Reino Unido foram triplicadas em seu mandato e o país apoiou quase todas as intervenções militares conduzidas pelo Pentágono — incluindo o bombardeio da Líbia, realizado a partir das bases aéreas britânicas.

Durante a Guerra das Malvinas, Thatcher ordenou o torpedeamento do cruzador General Belgrano, que resultou na morte de 323 pessoas, e chegou a cogitar o uso de armas nucleares contra a Argentina.

Seu governo apoiou uma série de regimes repressivos, nomeadamente a sanguinária ditadura de Augusto Pinochet no Chile. Ela manteve seu apoio ao regime do apartheid na África do Sul até o fim dos anos 80, chegando a rotular Nelson Mandela e o Congresso Nacional Africano como “terroristas”.

A reação popular

As medidas tomadas por Thatcher tiveram consequências devastadoras para os trabalhadores. Setores tradicionais da economia inglesa, como a indústria de ferro e carvão, foram praticamente extintos em função da desregulamentação do mercado, deixando centenas de milhares de pessoas desempregadas.

A taxa de desemprego no Reino Unido aumentou para o maior percentual da história, ao passo que o poder de compra da população caiu para o menor nível registrado desde a Segunda Guerra Mundial. Tal conjuntura levou ao crescimento da desigualdade social e ao rápido empobrecimento da população.

A classe trabalhadora reagiu organizando uma série de greves, mas foi brutalmente reprimida pelo governo. Foi esse o caso, por exemplo, da greve dos mineiros, organizada entre 1984 e 1985, violentamente atacada pelo exército britânico e subjugada pela imposição de uma severa legislação antissindical.

O movimento autonomista da Irlanda do Norte também foi alvo de violenta repressão durante o governo Thatcher, que promoveu a ação de esquadrões da morte e grupos paramilitares. Indiferente às demandas dos prisioneiros irlandeses, a primeira-ministra permitiu que Bobby Sands e outros nove militantes autonomistas morressem após mais de dois meses de greve de fome.

Refletindo a insatisfação popular, gigantescos protestos eclodiram por todo o país, com centenas de milhares de pessoas exigindo a saída de Thatcher. Mas, respaldada pelo apoio do mercado e da imprensa, a primeira-ministra se manteve no cargo por mais de uma década, até sua renúncia em novembro de 1990.

Nos anos seguintes, Thatcher seguiu participando das campanhas conservadoras e respaldou Iain Duncan Smith como líder do partido. Ela se entusiasmou com o crescimento da facção neocon no Partido Trabalhista e elogiou efusivamente Tony Blair por seu apoio à Guerra do Iraque. Defendeu, por fim, que o Reino Unido saísse da União Europeia e aderisse ao Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA).

A morte de Thatcher

Margaret Thatcher faleceu em 8 de abril de 2013, em consequência de um acidente vascular cerebral. A mídia britânica e a nobreza lamentaram seu falecimento, chamando-a de “a melhor primeira ministra em tempos de paz”. A Câmara dos Comuns foi convocada a realizar uma sessão especial em honra da primeira-ministra e uma série de homenagens públicas foram programadas.

Enquanto a burguesia inglesa e os líderes mundiais se esforçavam em demonstrar consternação e tristeza, o povo britânico resolveu fazer exatamente o oposto: sair às ruas para celebrar a morte de Margaret Thatcher.

Celebrações espontâneas eclodiram por todo o território britânico — sobretudo nas cidades com grandes comunidades operárias. Os festejos atraíram multidões em locais como Liverpool, Brixton, Leeds, Cardiff, Glasgow e Belfast.

Em Londres, milhares de populares se reuniram na Trafalgar Square, realizando uma festa que se prolongou por várias horas — e que se repetiu por alguns dias.

Os manifestantes portavam faixas e cartazes com frases de apreço pela partida de Thatcher e entoavam canções irônicas — em especial, “Ding Dong! The Witch is Dead” (“Ding Dong! A bruxa morreu”), do filme “O Mágico de Oz”.

As comemorações se converteram em legítimos festejos populares, regados com muita cerveja, música e dança. Até mesmo desfiles de rua foram improvisados, com multidões celebrando como se fosse um carnaval.

Populares encheram a entrada da casa da primeira-ministra de garrafas de leite, para lembrar os cortes que ele promovera. E até mesmo uma petição pedindo a privatização do funeral de Thatcher foi organizada.

Pela primeira vez, os portais de notícia do Reino Unido tiveram de bloquear as seções de comentários, pois a população, tomada de euforia, não cansava de postar manifestações de apreço pela partida da “Dama de Ferro”.



Fonte: Opera Mundi

trezzenews