Depois de figurar no terceiro lugar na lista de moedas que mais se desvalorizaram frente ao dólar, desde que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou o plano tarifário global, em 2 de abril, na quarta-feira (9), o real viveu um dia de forte oscilação frente ao dólar.
Na máxima do dia, o dólar à vista chegou a ultrapassar a barreira dos R$ 6. Porém, depois que Trump anunciou alívio nas tarifas para países que não revidaram, a divisa norte-americana encerrou o dia com baixa considerável de 2,51%, aos R$ 5,845.
Levantamento feito pela consultoria Austin Rating, com dados do Banco Central, mostra que, de 2 abril, quando foram anunciadas as famigeradas “tarifas recíprocas” pelo presidente dos Estados Unidos, até a terça-feira (8), o real perdeu 5,10% de seu valor frente ao dólar. A queda colocou a moeda brasileira em terceiro lugar em perda de valor frente à divisa norte-americana.
Os dois primeiros lugares foram ocupados pelo dinar, da Líbia (-13,20%) e pelo peso colombiano (-5,80%).
Desde que Trump tomou posse, em 20 de janeiro, o dólar vinha numa trajetória descendente. Com os anúncios tarifários feitos pelo republicano, especialmente os embates diretos com a China, fazem com que a moeda norte-americana tenha dias de muita oscilação.
O caldo vem entornando desde que a China, principal alvo do tarifaço de Trump, começou a revidar. Isso trouxe temor de uma escalada na guerra comercial e suas consequências à economia global. Na quarta-feira (9), por exemplo, Trump subiu de 104% para 125% as tarifas sobre produtos importados da China. Até agora, o governo chinês, que havia anunciado sobretaxas de 84% a produtos comprados dos EUA em resposta ao plano tarifário do republicano, não anunciou novo revide.
Em entrevista ao ICL Em Detalhes da terça-feira (8), a economista e apresentadora do ICL Mercado e Investimentos, Deborah Magagna apontou que o mercado financeiro precisa de previsibilidade para agir.
“O mercado age na expectativa, o mercado age no boato e, quando o fato acontece, muito já foi precificado. Os mercados já estavam precificando tudo isso [o tarifaço de Trump] na semana passada. Vimos o derretimento das bolsas, principalmente as nova iorquinas, acontecendo do meio para o fim da semana, e isso veio da expectativa de como essas tarifas iam bater nos Estados Unidos – no setor automotivo, no setor de tecnologia. Quando as tarifas são anunciadas, ainda tem um efeito acontecendo, porque tem todo um medo de como os países vão responder a isso”, explicou.
A situação, segundo ela, deve perdurar. “Vai ser muito difícil a gente saber o fundo do poço, porque o fundo do poço no mercado é o mais difícil da gente saber”, disse.
“Gangorra” do real é efeito do aumento da percepção de risco
Diante da imprevisibilidade instalada com as mudanças de rota impostas por Donald Trump, investidores temem as consequências das políticas para a economia norte-americana, que podem elevar a inflação no país, levando o juros a serem mantidos em nível alto por mais tempo.
Como sinalizou o próprio presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA), Jerome Powell, a política de Trump dificulta a condução da política monetária, pelos riscos de gerar um ambiente de “estagflação”, que é o pior dos cenários: inflação alta com estagnação econômica.
Esse temor de um futuro incerto pode resultar em retração da atividade econômica, já que os juros altos tornam mais caro consumir e investir.
O aumento da percepção de risco faz com que os investidores deixem mercados mais arriscados, como os emergentes, em busca da segurança dos mercados maduros.
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, disse à reportagem da BBC News Brasil que, no caso do Brasil, pesa ainda o fato de que o país tem uma entrada e saída de fluxo de capitais muito fácil, por quase inexistirem taxas e travas regulatórias.
Esse cenário faz com que muitos investidores aproveitem os juros altos por aqui (a taxa básica de juros, a Selic, está em 14,25% ao ano) para obter ganhos e, com a piora de cenário global, redirecionam seus recursos para investimentos considerados mais seguros. “Agora, a preocupação do investidor não é ganhar, é perder o menos possível”, disse o analista.
Peso da China
Outro aspecto apontado por Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos, também à BBC News Brasil, é a alta exposição da economia brasileira à China. “Todas as moedas que operam em função do yuan e da economia da China se desvalorizaram [até a terça-feira], e o real entrou nesse meio, por ter uma economia bastante exposta”, disse.
Aqui, a preocupação é o fato de a China poder ser muito afetada pela guerra comercial com os Estados Unidos, prejudicando a demanda pelas commodities brasileiras (no caso, minério de ferro e petróleo).
Fonte: ICL Notícias