Por Rafael Medeiros | TREZZE Comunicação Integrada
Há uma linha tênue entre o que chamamos de história e o que se torna mitologia política. O sionismo, enquanto movimento colonial, não apenas ocupou terras palestinas – ocupou primeiro o imaginário ocidental, vendendo-se como redenção de um povo quando, na prática, tornou-se a condenação de outro. Essa não é uma discussão sobre religião ou etnia, mas sobre como estruturas de poder se perpetuam através da confusão calculada entre identidade e ideologia.
Quando um sobrevivente do Holocausto como Hajo Meyer afirma que “o sionismo fez aos palestinos o que os nazistas fizeram com os judeus“, não estamos diante de uma equação moral, mas de um alerta histórico. A lição mais perversa que Israel aprendeu com seus próprios algozes foi justamente como um Estado pode instrumentalizar o trauma coletivo para justificar novas formas de violência.
A acusação recorrente de “antissemitismo” contra críticos de Israel não é um argumento – é um mecanismo de silenciamento. Funciona como um código de acesso: quem ousa questionar as políticas israelenses é imediatamente colocado do lado de fora do debate legítimo. Essa estratégia, porém, esconde uma ironia cruel. Ao transformar o judaísmo em escudo para o projeto sionista, seus defensores cometem o verdadeiro ato antissemita: reduzem uma tradição milenar complexa a mero instrumento geopolítico.
Os judeus antissionistas – dos Neturei Karta aos acadêmicos da Jewish Voice for Peace – entendem o perigo dessa equação falsa. Sua resistência prova que o antissionismo pode ser, na verdade, a forma mais autêntica de amor ao judaísmo: um amor que recusa ver sua espiritualidade transformada em justificativa para tanques.
Gaza hoje é o espelho que devolve ao Ocidente sua própria imagem distorcida. Cada criança morta por uma bomba “made in USA” é o retrato do que realmente importa nas alianças internacionais: não valores, não princípios, mas interesses. Quando a Europa chora pelo Holocausto enquanto financia o exército que repete crimes similares, ela não está exercendo memória – está praticando necropolítica.
A verdade inconveniente é esta: o antissionismo não é apenas uma posição política legítima, mas um imperativo ético para qualquer um que realmente acredite em justiça. Descolonizar a Palestina não é um ato de ódio – é um ato de reparação histórica. E nesse processo, talvez descubramos que libertar os palestinos seja também libertar o próprio judaísmo das garras do nacionalismo militarizado.
A pergunta que fica não é “por que criticam Israel?”, mas “por que demoramos tanto para ouvir os judeus que já alertavam sobre isso?”. Quando o rabino Weiss, do Neturei Karta, é agredido por carregar a bandeira palestina em protestos, fica claro: o sionismo não teme o antissemitismo – teme a solidariedade.
Este texto não é um ponto final.
É um convite para que você:
1. Reflita sobre como as palavras são armadas
2. Questione quem se beneficia dessa confusão
3. Escute as vozes judaicas dissidentes
“Nossa luta não é contra um povo, mas contra um sistema que corrompe até a memória do Holocausto”
– Marc Ellis, teólogo judeu
“Escrevo com tinta vermelha daqueles que já não podem sangrar“
Rafael Medeiros
TREZZE Comunicação Integrada.