quinta-feira, junho 12, 2025

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Na reforma em estudo, corte em direitos são tratados como certezas enquanto privilégios ficam intactos

Por Cleber Lourenço

O deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), coordenador do grupo de trabalho da reforma administrativa na Câmara dos Deputados, é hoje o principal defensor da chamada “desindexação” do Orçamento: uma proposta que mira diretamente nos pisos constitucionais da saúde e da educação, bem como na vinculação de benefícios sociais ao salário-mínimo. Em entrevista ao ICL Notícias, o parlamentar afirmou que é preciso abrir espaço fiscal “rompendo com essas travas constitucionais” para dar flexibilidade à União.

A minha opinião é que nós estamos chegando num ponto sem volta. Há algo que envergonha a sociedade, que é essa constante, interminável, salários acima do teto… produz uma profunda desigualdade no serviço público.”
Apesar disso, Pedro Paulo evita se comprometer com medidas efetivas para acabar com os supersalários. Disse ao ICL Notícias que tanto os vencimentos acima do teto quanto a previdência dos militares estão “na prateleira”, o que, na prática, significa que esses temas só serão incluídos se houver apoio expressivo dos líderes partidários.

“Os supersalários estão sendo discutidos pelo grupo de trabalho, sim. E a previdência dos militares está na ‘prateleira’, sim.”

Porém, em entrevista ao jornal O Globo, o deputado foi direto ao minimizar o impacto dos altos salários:

“Atacar supersalários dos procuradores são medidas de efeito retórico. Economicamente, não muda nada.”
Isso evidência que, na verdade, o deputado tem atuado com empenho para avançar sobre garantias constitucionais da base social. “Se o Brasil pagar o que está comprometido com os pisos da saúde, da educação e com a vinculação do salário mínimo, não vai sobrar nada”, declarou em outra entrevista recente. Para ele, romper essas vinculações é prioridade da reforma administrativa que conduz na Câmara.

Pedro Paulo também confirmou que tanto os supersalários quanto a previdência dos militares são considerados temas “difíceis” que exigem convergência política para entrarem na proposta. Mas não se referiu às medidas contra a população mais pobre com o mesmo cuidado.

Estamos tentando construir uma proposta que tenha, de alguma forma, capacidade de efetivamente disciplinar essas questões”, disse. “Mas tem que ser um momento patrocinado pelos líderes da Casa. Ao menos a maioria.”

Hugo Motta reforma

Hugo Motta criou grupo para propor reforma administrativa

O contraste salta aos olhos: o mesmo deputado que classifica como difícil enfrentar as distorções do topo, avança sem hesitação sobre os pilares mínimos da proteção social. A proposta de Pedro Paulo inclui ainda sugestões para facilitar demissões, limitar a progressão na carreira de servidores e ampliar contratações temporárias, todas voltadas à base do funcionalismo.

O grupo, criado por Hugo Motta (Republicanos-PB), tem 45 dias para apresentar a proposta final. Enquanto isso, o governo federal acompanha com reservas. A equipe de Esther Dweck (Gestão e Inovação) já indicou preocupação com o teor fiscalista da reforma, que pode ser vista como um ataque direto ao pacto social inscrito na Constituição.

A expectativa de votação da reforma ainda neste semestre reforça a urgência dada a temas como a flexibilização de regras orçamentárias constitucionais. A mesma urgência, no entanto, não se aplica aos supersalários nem às aposentadorias generosas dos militares, mantidas como carta de gaveta para negociação política posterior.

Esse desequilíbrio escancara a lógica da reforma: o que afeta os de cima é protelado; o que pesa sobre os de baixo é acelerado. A condução de Pedro Paulo mostra disposição para desmontar estruturas de proteção social e trabalhista, mas evita confrontar interesses de corporações poderosas e bem representadas.

A promessa de modernização administrativa se transforma, assim, em mais um capítulo da velha política de preservação de privilégios. Em vez de atacar a desigualdade, a proposta tende a aprofundá-la — cortando de quem tem menos e preservando quem já leva mais.

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